Com
o último post, vieram mais “companheiros de pensamentos” e, assim, já somos
150.
Nunca
imaginei que chegaria a este número quando comecei a “desabafar” para este meu
blog.
Achei
interessante este post, sobre o que meu pai dizia, ter “convidado” mais pessoas
para este cantinho.
Muitas
vezes, quando assisto a programas de televisão e ouço depoimentos de pessoas
dizendo que seus pais, geração anterior ao 25 de abril, eram muito autoritários
e distantes; pasmo de como o meu pai podia ser tão diferente.
Lembro
de minha mãe contar que, certa vez descíamos a Rua do Sol ao Rato e eu, que
contava uns 5, 6 ou 7 anos, estava aos empurrões com meu pai e vice-versa. Como
aquela rua era (ou ainda é, não sei) muito estreita, minha mãe vinha mais
atrás e ouviu um comentário de um casal que ao observar-nos disse: - Que falta
de respeito!
Minha
mãe, sempre muito educada, apesar de ser de poucas falas, não se conteve. Dirigindo-se
ao casal, a sorrir, disse: - O que estão a ver não é falta de respeito. O que
vêm é uma filha e um pai a brincarem. Garanto-vos que há muito respeito,
educação e carinho.
Minha
mãe não ouviu resposta e continuou seu caminho. E nós continuámos a nossa
brincadeira, alheios a tudo, porém… se esse casal visse as nossas brincadeiras
dentro de casa… ficariam em choque. Havia batalhas de almofadas, corridas de
carrinhos no corredor, cambalhotas … Estávamos na década de 60.
Não
via o meu pai durante a semana: quando ele saía para o trabalho, eu ainda
dormia; quando ele chegava, eu já dormia. Mas no domingo… Ah, o domingo! Meu
pai esquecia o cansaço e era só alegria.
Não,
meu pai não era autoritário. Mas havia autoridade, sim. Meu pai e minha mãe só
tinham uma palavra. Quando era NÃO, era não; quando era SIM, era sim. Porém, também
existia o TALVEZ; quando um dizia que primeiro ia conversar com o outro.
(Independente se era mãe ou pai.)
Nunca
apanhei de nenhum deles. Quando fazia alguma asneira, meus pais tinham atitudes
distintas: minha mãe dizia, simplesmente, que estava triste com a minha atitude
e que eu devia pensar melhor nas minhas ações e suas consequências; meu pai
aplicava os seus “sermões”. Não havia gritos, nem palmadas, apenas MUITA
conversa.
Lembro
de uma dessas situações que ficou bem marcada na minha memória.
Estávamos
em Luanda, Angola. Tinha 10 anos. Era fim de semana. Minha mãe pede-me para
fazer um recado ao Sr. Carvalho, dono da mercearia do bairro. Lá fui eu, fiz o
recado e, ao sair da mercearia, peguei numa maçã (não lembro do recado mas
lembro bem da maçã!) com a intenção de, ao chegar em casa, lavá-la para comer.
(Apenas um detalhe: havia fruta variada em nossa casa. Não era fome.)
Chego
em casa e, meu pai ao ver a maçã, pergunta por cima do jornal que lia:
-
O Sr. Carvalho deu-te uma maçã? (Era hábito ele dar-me sempre uma fruta. Não
por necessidade, graças a Deus; mas, mesmo, por mimo.)
Respondi,
tranquilamente:
-
Não.
Nesse
momento, meu pai deixa o jornal de lado, olha-me bem nos olhos e atira-me outra
pergunta:
-
Pediste a maçã?
E
eu, com a maior calma:
-
Não.
Observando
o semblante do meu pai, percebi que tinha feito asneira.
-
Se ele não te deu e tu não pediste, como é que essa maçã está nas tuas mãos?
Eu
já não me sentia muito confortável mas respondi:
-
Eu peguei.
Não,
não houve gritaria, nem palmadas, nem castigos, o que se seguiu, nunca mais
esqueci.
-
Não, Ana Paula; tu não pegaste. Tu roubaste! Quando se pega alguma coisa de
outra pessoa, sem pedir autorização, é roubo. E, portanto, vais agora devolver
o que roubaste. E eu vou contigo para desculpar-me pela tua atitude.
E
lá tivemos mais um daqueles sermões, tipo: “se precisasses, que nem é o caso,
pedias”; e mais uns outros tantos.
O
caminho até à mercearia parecia não ter fim.
A maçã pesava imenso na minha mão.
Chamar
o Sr. Carvalho, olhá-lo nos olhos e confessar o que tinha feito foi duro. Por
um segundo, tive a impressão que o Sr. Carvalho ia dizer com a sua voz forte
que estava tudo bem e que podia ficar com a bendita maçã. Mas ele olhou para o
meu pai que estava atrás de mim e deve ter entendido que eu tinha que aprender
essa lição de meu pai.
E aprendi!